

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO: aspectos importantes para clínicas e hospitais
A “pejotização” e os requisitos de validade do planejamento tributário
A fiscalização tributária tem concentrado esforços na análise de estruturas societárias e negociais envolvendo médicos, clínicas médicas e hospitais, especialmente para avaliar os efeitos tributários da forma de contratação dos profissionais da saúde, tais como médicos, psicólogos, terapeutas, fonoaudiólogos etc.
Para o Fisco, algumas estruturas refletem a chamada “pejotização”, que seria a contratação de prestação de serviço por pessoa jurídica ou inclusão dos profissionais no contrato social da clínica ou hospital, com o intuito de fraudar a legislação trabalhista e tributária. Essa manobra evitaria, por exemplo, a incidência de Contribuição Previdenciária Patronal (20% sobre folha), Imposto de Renda Pessoa Física (até 27,5% sobre a remuneração) e Contribuição Previdenciária do Empregado (11% sobre a remuneração).
Apesar do cenário preocupante, não há motivos para desespero. Primeiro porque a contratação de prestação de serviços médicos entre pessoas jurídicas, por si só, não configura ilícito tributário. O mesmo pensamento vale para a inclusão de novos sócios no contrato social da empresa. Em segundo lugar, cada caso necessita de avaliação própria, especialmente para verificar a existência da forma jurídica criada e o cumprimento dos elementos necessários para a validade do negócio jurídico.
O que importa é a existência de elementos justificadores da respectiva forma de contratação, como organização negocial, ganho de eficiência, aumento da capacidade de atendimento e compartilhamento de responsabilidade civil. No caso de profissionais admitidos na sociedade, também é importante demonstrar o interesse social no novo sócio e o impacto positivo nos resultados do negócio.
O planejamento tributário necessita de prova dos negócios jurídicos celebrados, para que não seja caracterizado como ato de dissimulação ou simulação em sentido estrito. Em outras palavras, é preciso que a prestação de serviços por meio de pessoas jurídicas seja efetiva e não se confunda com um contrato de trabalho.
Na maioria dos casos com fiscalização em curso ou auto de infração já lavrado, o contribuinte tem enfrentado dificuldades de comprovar a prestação de serviços pura ou a participação efetiva do profissional como sócio da pessoa jurídica. A fragilidade probatória pode levar à conclusão, por exemplo, de haver simulação na forma de contratação, que embora estruturada como prestação de serviços, se materializa como verdadeira relação trabalhista.
O problema está na realização de estrutura meramente formal, com a simples assinatura de termo de prestação de serviços entre pessoas jurídicas ou inclusão do profissional no quadro societário, sem prova da inexistência de subordinação ou de efetiva participação do respectivo profissional como sócio.
É preciso ficar claro que, atualmente, para o direito tributário, não é suficiente a existência de mero contrato de prestação de serviços ou pagamentos de uma PJ a outra PJ. Se o Fisco compreender que a situação fática comporta todos os elementos da relação trabalhista e, de outro lado, o contribuinte não tiver material probatório em sentido contrário, o risco de autuação passar a ser elevado tanto para pessoa física do profissional quanto para a pessoa jurídica contratante.
Se caracterizada a fraude fiscal, além do tributo devido, a autuação poderá trazer multa qualificada de 150% sobre o valor principal do tributo, multa de mora limitada a 20% do valor principal e correção com incidência da Selic. Se não bastasse, também há risco de a fiscalização concluir pela existência de indícios de crime contra a ordem tributária praticado pelos gestores da pessoa jurídica e pelos profissionais pessoas físicas.
Em fevereiro de 2019, a 4ª Câmara da 2ª Turma Ordinária do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF desconsiderou os contratos de prestação de serviços de artistas e jornalistas celebrados com a Globo Comunicação e Participações S/A, em razão do seguinte fundamento: “se a fiscalização constatar que o segurado contratado como contribuinte individual, avulso, ou sob qualquer outra denominação, preenche as condições caracterizadoras da relação de emprego, deve desconsiderar o vínculo pactuado e enquadrar tal segurado como empregado”.
Apesar da possibilidade de reversão desse julgamento em grau de recurso ou, ainda, no âmbito Judicial, os fundamentos adotados servem de alerta às estruturas frágeis comumente criadas pelos contribuintes e que podem ser questionadas pela autoridade fiscal. Quanto maior a robustez da estrutura negocial, mais eficiente será o planejamento tributário, que deve considerar a realidade individual de cada negócio e os riscos que envolvem determinada operação.